Conflito na Colômbia deixou 15.000 vítimas de violência sexual
Cerca de 15.000 vítimas de violência sexual, 91% delas mulheres, são o resultado de mais de meio século de conflito armado na Colômbia, que envolve por igual paramilitares e guerrilheiros, segundo um estudo oficial.
Entre as diversas formas de violência que afetaram o país, a sexual é a mais esquecida, indica o Centro Nacional de Memória Histórica (CNMH) no documento que é apresentado nesta sexta-feira em Bogotá.
“Nenhum agente armado admite com franqueza ter estuprado, assediado ou prostituído à força uma vítima. É muito mais fácil confessar o desapossamento, o deslocamento forçado e inclusive o assassinato”, indica o relatório “A guerra inscrita no corpo. Relatório Nacional de Violência Sexual no Conflito Armado”.
Desde a década de 1960 e até 20 de setembro de 2017, foram registradas 15.076 vítimas de delitos contra a liberdade e a integridade sexual, indicou o CNMH, que se apoiou em testemunhos e organizações de mulheres vítimas.
Os paramilitares foram responsáveis por 4.837 casos (32,2 %), e as guerrilhas por 4.722 (31,5 %).
“As guerrilhas exerceram violência sexual de forma constante, em intensidade relativamente baixa”, enquanto os paramilitares, desmobilizados em 2006, a praticaram “como uma clara modalidade associada às estratégias para instaurar terror”, afirma o CNMH.
Agentes do Estado (206 casos) e grupos armados posteriores à desmobilização dos paramilitares (950) também figurem entre os exemplos documentados, e em quase 4.000 casos não foi possível estabelecer o responsável.
Um total de 91,6 % das vítimas eram meninas, adolescentes e mulheres adultas.
Além do estupro, escravidão sexual e prostituição forçada, há outras modalidades que afetam os direitos sexuais ou reprodutivos, como a esterilização, o aborto e o planejamento forçados.
– Farc “oferecerão a verdade” –
Os paramilitares se desmobilizaram em 2006, após um acordo com o governo do então presidente Álvaro Uribe, enquanto seu sucessor, Juan Manuel Santos, assinou um acordo de paz há um ano com a já desarmada guerrilha e agora partido das Farc, e está em diálogos com os rebeldes do ELN.
O relatório é divulgado em um momento em que o Congresso está votando a regulamentação da Jurisdição Especial para a Paz (JEP), o sistema encarregado de julgar os delitos atrozes, e que prevê penas alternativas à prisão aos que confessarem seus crimes, repararem as vítimas e se comprometerem a nunca mais exercer a violência.
Nesse sentido, o CNMH pede às Farc que reconheçam “os atos de violência sexual pelos quais são responsáveis, como parte das medidas de reparação e vontade de paz que o processo atual demanda”.
O ex-chefe negociador das Farc, Iván Márquez, indicou que essa organização está disposta a “oferecer a verdade” ante os tribunais especiais.
“Não estou negando que em um longo conflito tenha havido problemas desta índole. (…) Não vamos prejulgar, nem pretender que condenem nenhum dos envolvidos no conflito até que esclareçam sua situação ante a JEP”, afirmou à rede CNN em espanhol.
A violência sexual no âmbito do conflito aumentou entre os anos 2000 e 2005, quando ocorreram 45,7% dos casos, “em concordância com a arremetida paramilitar, a implementação de seu projeto armado e o fortalecimento e recrudescimento das ações das guerrilhas”, segundo o documento.
Cinco décadas de conflito na Colômbia deixaram 7,5 milhões de vítimas, entre mortos, desaparecidos e deslocados.